"Nenhum ser humano é capaz de esconder um segredo. Se a boca se cala, falam as pontas dos dedos..."(Freud)

domingo, 16 de março de 2025

Amor de brilhantes

Sou fascinada pela relação da humanidade com jóias: pequenos pedaços de minério brilhante que tem pouca ou nenhuma utilidade para além de enfeitar que os usa. Também são guardiões de valores, monetários e sentimentais, passados de geração e geração. 

Há jóias que duram por incontáveis anos. 
Algumas delas possuem uma história recordada e celebrada, e geralmente moram em museus ou ficam guardadas a sete chaves, voltando a ver o mundo em raras ocasiões. É como se o preço da notoriedade de uma jóia fosse nunca mais ser usada por alguém menos importante. 

Outras, igualmente antigas e valiosas, tiveram sua história esquecida e voltaram a ser apenas objetos, a ter seu valor medido por quanto seus minérios valem em dinheiro. Mas há, no entanto, jóias menos célebres porém não esquecidas, cujo valor é imensurável, pois tem história viva e recordada por quem as possui, e não há outro objeto que possa substituir a memória afetiva por elas representada. 

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Levei anos para, finalmente, ganhar jóias afetivas. Um anel de outro e pérola, cujas quatro cópias idênticas moram nos dedinhos das mulheres da minha vida, mãe e irmãs. Um símbolo físico do amor que eu tenho pelas minhas queridas que moram do outro lado do oceano. Outro anel, um aro dourado com um brilhante oval, símbolo do amor e expresso desejo de viver uma vida a dois. Um colar de pérola solitária, presente que eu mesma me dei por enfrentar uma das maiores dificuldades a que tive que me submeter para alcançar um objetivo e que merecia ser eternizado em ouro e pérola, símbolo da dificuldade que a ostra passa para produzir beleza. 

Guardo (e uso) as minhas  jóias com o carinho que as situações que as trouxeram evocam. Um colar é um emprego, um anel é um amor e outro, uma irmã. Peças reais e duradouras, que vão carregar suas histórias para muito além de mim, enquanto houver quem delas se lembre. 

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Um outro dia me peguei pensando no quanto seria incrível ter ganhado uma jóia de quem foi meu primeiro amor. Ou uma jóia em um aniversário especial, um final de curso, uma pessoa querida que já não está na minha vida. E me perdi pensando nessas jóias imaginadas que nunca chegaram a existir. 

Não há, porém, registros de "jóias imaginárias", essas peças inexistentes cuja história é perpetuada, embora não haja objetos que a recordem. Mas, no meu coração, elas existem. 

Tenho comigo amores e memórias que me são caros como jóias; são como pequenos suvenires de sensações preciosas que já tive, e que não quero esquecer. Não as levo no pescoço ou nos dedos, mas no recanto mais profundo da minha memória. São pedaços brilhantes de vida, que carrego como os bens mais preciosos que tenho, embora sejam invisíveis e intangíveis. Quando a alegria me parece impossível, quando a felicidade me parece incompleta e inalcançável, toco minhas pequenas jóias com a ponta da alma. Ao tocá-las, desperto a memória de que já vivi inteira, que já me senti plena e completa. Alegria é um lugar possível, um estado de espírito alcançável e, quando fecho os olhos e toco minha jóia, sei disto: já estive lá.