"Nenhum ser humano é capaz de esconder um segredo. Se a boca se cala, falam as pontas dos dedos..."(Freud)

sábado, 21 de julho de 2007

Pétalas

Não me reconheço, em mim. Leio os meus antigos escritos, e me sinto como deveria sentir-se uma rosa desfolhada ao contemplar suas pétalas murchas, ao chão. Estranho aquelas pétalas murchas, que antes me eram tão caras e que agora, já não são mais eu. Passei a reler meus textos e me senti, de certa forma, uma intrusa em meio àqueles pensamentos que já não me representavam mais. Pensei em excluí-los, mas que droga, não há razão para fazê-lo.
Mudei tanto que modifiquei até o que não desejava mudar. Fiz gato e sapato de sensações e sentimentos passageiros e me coloquei por completo naqueles retratos de instantes, de sensações que às vezes não perduravam para além da noite de sono que seguia a escrita... Minha personalidade era rocha firme. Muitas vezes, me magoava ser tão dura assim, mas na maior parte do tempo, ah, como eu gostava...
Gostava, como gosto agora de perceber a sutil evolução dos pensamentos, nas palavras... Percebo que a pétala caída também sou eu, que a folha que se foi já não é, mas um dia foi parte de mim. Vergonha deles? Não. Essas poucas palavras que conseguia expelir para me libertar/desabafar foram o início da jornada mais libertadora da minha vida física: a escrita. Pela escrita, falo com pessoas distantes, com quem jamais falaria, em toda a vida. Falo com pessoas que vejo com freqüência, mas jamais diria o que digo aqui. Mostro-me com a mesma facilidade com que me escondo na vida real, atrás de máscaras de suposto mau-humor ou de fingida timidez. São só máscaras, que caem quando escrevo e que só quem conhece o que há por trás delas, sabe o quanto são falsas... Tão falsas, que já me disseram (inclusive em depoimento no orkut) que é impossível acreditar que alguém acredite em uma Bruna assim.
Escrever é libertar-se. De regras, de gramática e até de si mesmo. Posso repetir palavras, posso sentir o que finjo não sentir, posso ser eu mesma, aquela que em verdade, nem sou. Posso falar o que quiser, não importa se alguém vai ler: eu mesma vou.
Escrever é, também, conhecer a si mesmo. Eu não sabia que era feliz até escrever sobre felicidade, eu não sabia o quanto era cristã até escrever sobre Cristo, não sabia que era poeta até fazer poesia, e nem sabia o quanto amava até escrever sobre amor. Posso dizer então, que simplesmente não sabia quem eu era, enquanto não escrevi.
Existe uma alegoria de Platão que resumidamente diz que nossa auto-imagem é como se estivéssemos voltados para o fundo de uma caverna, observando apenas nossa própria sombra, acreditando tratar-se da realidade. Pois bem: a escrita não é a libertação propriamente dita, mas é um espelho colocado no fundo desta caverna. Faz com que possamos nos ver mais nitidamente, revela pensamentos e sensações que desconhecíamos, até que os escrevemos.
Ops, mais um texto. Mais um pouquinho de mim, para mim. E para quem quiser.

"Não te aflijas com a pétala que voa:
também é ser, deixar de ser assim.
Rosas verá, só de cinzas franzidas,
mortas, intactas pelo teu jardim.

Eu deixo aroma até nos meus espinhos
ao longe, o vento vai falando de mim.
E por perder-me é que vão me lembrando,
por desfolhar-me é que não tenho fim."

Cecília Meireles, A Grande.

terça-feira, 3 de julho de 2007

Minhas Mãos (homenagem às mãos do Gabi)

Chamo-as assim não por serem efetivamente minhas, mas afetivamente, me pertencem. Elas destoam do todo, são paradoxalmente grandes e infantis, principalmente quando estão semi-encobertas por um determinado abrigo de moletom, que faz o dono delas parecer tão pequeno quanto é grande o abrigo. Essas mãos, que me obrigam a ser/parecer contraditória quando falo delas, tornam difícil a conclusão de qualquer raciocínio, por mera insuficiência de instrumentos lógicos...
São mãos grandes, de dedos grossos, que por isso parecem curtos, dando a impressão de impossibilidade de efetuar trabalhos minuciosos, são mãos com unhas infantis e palma larga, aparentemente feitas para trabalhos pesados, que, afinal, executam com destreza e rapidez.
Mas o que de melhor elas fazem é justamente o oposto do que parecem feitas para fazer: elas aquecem, acariciam e sustentam como nenhuma outra. Fazem os problemas parecerem pequenos, os fazem caber na palma da mão e desaparecerem em um piscar de olhos... são mágicas.
Fazem cócegas, fazem rir, fazem dormir, consertam o que parecia sem conserto, realizam sonhos e assustam quando largam o volante só por diversão... E no volante elas me levam pra longe, só pra arrancar sorrisos e suspiros de alívio quando estou em um lugar especial, onde nós dois repousamos nossas mentes e largamos os problemas lá atrás, deixando o sol bater e o vento soprar, vendo as folhas caírem, vendo o tempo passar... A precisão destas mãos ao guiar um carro me faz pensar em como guiarão minha vida...
Sim, porque, um dia, o dono daquelas mãos vai pedir a minha...